Tumores digitais
A neoplasia da modernidade
As pessoas não sabem mais ficar entediadas sem o smartphone, sem rede social, sem mensageiros, sem internet, estamos todos adoecendo.
A síndrome do smartphone acometeu nossa sociedade. Acordamos com o aparelho soando e não despertamos dessa ilha digital, estamos cercados por telas que emitem luz antes mesmo do sol entrar pela janela do nosso quarto.
Enfrentamos uma doença virtual coletiva, mais severa que uma pandemia.
Você já deixou o celular em casa e reparou como é assombroso como quase todos estão vivendo? Desde que você tem um celular quanto tempo você passou sem ele?
Alguns acham que estão no controle, mas se o aparelho está por perto é raro que não se acople ao indivíduo. É como se fosse um tumor digital que carregamos voluntariamente. Esse tumor está se multiplicando pelos nossos dias, tempo e afazeres.
Você já deve ter visto sobre “crianças viciadas em telas”. Já parou para raciocinar sobre: adultos viciados em telas? Uma vez vi um vídeo de humor tal como no cartaz de uma cigana “trago sua vida de volta” o rapaz entra pela porta, pergunta como funciona, o sujeito pede o celular e o quebra “pronto, pode voltar a viver agora.” É só um meme?
Nossa independência se fragilizou demais, não sabemos mais ficar sozinhos. O smartphone é como um acelerador de partículas inverso: ao invés de nos fornecer energia, ele suga nossas energias. A mente está se perdendo na bolha da inteligência artificial que nos envia aquilo que induzidamente queremos ver, ouvir e deixar.
Criamos hábitos destrutivos de enviar uma mensagem e querer uma resposta imediata da outra parte, se ela não vem ficamos inquietos, ansiosos e deprimidos.
As coisas que fazíamos melhor pelo computador agora são disparadas sem organização e sem limite pelo whatsapp, é pavoroso! Quem é que ainda liga pra alguém? Só as pessoas mais próximas ou necessárias se telefonam.
Estamos indo para o precipício das nossas mentes, adoecendo e sorrindo em selfies. Ah que alegria postar uma foto da ilha da fantasia. Sem saber estar onde estamos nossa presença voa e fica apenas na fotografia que some em vinte e quatro horas. É pra quem ver? Pra que ver? Por que ver?
Pior: quando estamos com alguém, estamos mesmo ali? O celular que não cabe no bolso, o relógio que apita no pulso, a ansiedade que olha pra ambos e mergulha na frenética frequência da notificação. Notificação de que, de quem, pra que, por que?
Haja tempo pra perder!
Quantos livros você lia antes do smartphone? Quantos lê hoje em dia? Já reparou como sua concentração tem sido afetada?
Proteja o seu tempo, ele está passando, dá uma olhada nas configurações de Bem-estar do seu aparelho que revela quanto tempo, uso, desbloqueios e notificações você dedicou a sua tela. Isso me lembra uma história: um mentalista disse ao seu mentorado “pense todos os dias que você está enriquecendo, que é próspero e saudável e você será” o aprendiz contestou “que bobagem! te paguei pra ouvir isso?! Eu queria uma solução.” Então o guru retrucou “pois bem, então pense que você está empobrecendo, que vai quebrar e que está contraindo uma doença terminal.”
Aquilo que você se dedica você se transforma. Você é um avatar na internet ou é alguém de verdade?
Nesse ponto já vou previnir aos que me enviam comentários depois de ler o texto: sim eu uso o smartphone, estou entregando essa mensagem virtualmente por um deles a propósito. Eu não vou mais ao banco porque tem um aplicativo em que resolvo isso, eu ouço música nos streamings, marco compromissos, divulgo minhas ideias e trabalhos pelas redes sociais, sim, eu utilizo o mundo virtual e talvez eu esteja até mais nele do que muita gente que me lê e ouve.
Eu sou um observador, vejo em mim, vejo no outro, vejo na coletividade. Eu não estou demonizando o smartphone mas estou dizendo que ele é invasivo e inapropriado para a maioria dos momentos em que vivemos; não pelas suas funções, elas são excepcionais mas pelo seu domínio invisível sobre nosso tempo, ação e reação…
É assim que queremos viver?
Saimos de uma tela e entramos em outra. Saimos de nós mesmos, do nosso equilíbrio, do nosso tempo e vivemos acelerados perdendo a individualidade para viver uma vida em bando. Somos tão modernos e tão primitivos. Nos comparamos tanto, temos tantos números, modelos e personagens irreais que deixamos de mergulhar em nós mesmos para contrair a doença do mundo contemporâneo.
Tem uma vida perfeita por todo lado, tem conselho pra tudo, tá tudo impecável por fora e nos destruindo por dentro. Nossa doença entra por um smartphone, tentamos nos livrar do que nos consome, mas já está agarrado voluntariamente em nossas mãos. São tumores malignos e benignos se misturando, não importa, já estão anexados em nós, como se fossemos um arquivo virtual ou estivéssemos sendo só um papel descartável na sociedade; nossa individualidade foi clipada por um aparato do qual não conseguimos nos desvencilhar.
Um eclipse apagou o sol e a lua dos nossos dias e noites, raros são os que contemplam o sol, a lua, as estrelas, a chuva, a natureza. É tudo artificial. Artificial tem sido a nossa humanidade, frágil, massificada e adormecida com remédios para disfarçar o caos a que nós mesmos nos sujeitamos. Precisamos acordar antes de perder a nossa vitalidade, essa é a questão que precisamos pensar. Saia do feed e entre para a sua vida.
BÔNUS
SOLUÇÕES ENCONTRADAS
Esse é meu quarto texto sobre os males do smartphone. No anterior “a tecnologia a seu favor” eu investiguei e testei uma série de alternativas que amenizaram a incidência do aparelho celular na minha vida e recentemente adotei algo nesse entremeio que funcionou legal para mim:
Após passar um tempo utilizando um relógio celular com chip independente, a tecnologia quase me deu uma solução perfeita para essa saga contra a super conexão, porém o sistema não era plenamente compatível com o android, assim eu tinha que gerenciar dados em dois aparelhos e dois números, isso começou a me dar trabalho sem ser muito prático. Depois comprei um celular básico com teclado físico, mas a ausência de um sistema moderno me fez logo desistir de ir por esse caminho. Então por ausência de um relógio celular independente, funcional, moderno e integrado que ainda não lançaram, optei por utilizar um mini-smartphone que é plenamente compatível com minha conta do Google, assim o que atualizo no smartphone, atualiza nesse aparelho secundário: agenda, playlists, notas e etc.
Funcionou assim pra mim: após testar manter um único número de celular, tendo um segundo chip apenas para dados móveis, o preço de manter duas linhas estava acima do que eu queria gastar. As operadoras já quase não vendem um bom plano sem internet e eu acabava tendo que sair com dois aparelhos, um para atender aos telefonemas e o outro para utilizar o waze/maps e outras praticidades; ao invés de simplificar estava complicando.
Daí decidi ter mesmo dois números mesmo: um que tenho desde que comprei um celular aos 16 anos que é o meu oficial e um outro que serve apenas para atender ligação, pago apenas para manter a linha, ele funciona para mim como um telefone fixo, porém integrado ao android em uma tela mínima que não me desperta interesse de navegar por redes sociais, internet e mensageiros. Ele basicamente filtra quem pode me chamar interrompendo o não perturbe, atualiza minha agenda, lembretes e notas, mantém o whatsapp afastado e minhas playlists de música sincronizadas para eu ouvir em casa de maneira prática e descomplicada. Se eu preciso mesmo ir ao mensageiro ou fazer algo pela internet eu ligo o computador.
Assim, ao chegar do trabalho deixo o celular no carro e esqueço meu número social. Isso mesmo, é uma referência a como se fôssemos um número na multidão, sem nome, sem identidade, sem personalidade, apenas mais um... Logo, entro em minha casa e deixo o mal necessário lá fora onde eu não vou ficar tentado ou viciado em olhar o smartphone ou incomodar alguém de maneira impulsiva e ansiosa.
É como um detox:
“A desintoxicação, muitas vezes abreviada para detox, é um tipo de tratamento de medicina alternativa que visa livrar o corpo de “toxinas” não especificadas, substâncias que os adeptos afirmam se acumular no corpo e acrescento na mente e no comportamento ao longo do tempo e têm efeitos indesejáveis a curto ou longo prazo.”
Desse jeito tenho conseguido ler mais e me conectar mais a mim mesmo. Vale dizer que geralmente não tenho problemas com o celular quando estou com mais pessoas, mas desde que moro sozinho, essa foi uma maneira de estar mais perto de alguns, porém isso me distanciou de mim e isso não é bom para quem mora sozinho e precisa conhecer melhor sobre sua própria companhia. Viver sozinho exige resiliência, disciplina, foco… e um smartphone incidente não favorece nada disso.
Após esse boom de situações eu espero que algo tenha sido útil para você com essa experiência que acabo de compartilhar. Que você possa sair da multidão e encontrar o que te faz bem, que suas mãos possam tocar a realidade, que a sua coluna esteja ereta e a cabeça erguida sem se curvar a dependência de um aparelho que não faz parte de você.
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Meus textos sobre os males dos smartphones:
Te desafio
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A tecnologia a seu favor
Tumores digitais
Dica de leitura:
Você sabe o que é nomofobia? Entenda.